quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Nélson da Rocha: "As pessoas ficam bastante curiosas e surpreendidas"

Nélson da Rocha
Nélson da Rocha é atleta, capitão e diretor da Seleção Nacional de Matraquilhos. Pode parecer estranho ou engano mas não é. Portugal tem uma seleção, campeonato, equipas e é dos países com maior racio de praticantes de matraquilhos. Muito disso se deve à paixão de Nélson da Rocha, um português nascido em França com raízes em Lanheses.

Qual é a reação das pessoas quando sabem que há matraquilhos federado? 
As pessoas que não jogam, pensam que é uma brincadeira. Veem mais como uma forma de convívio do que como uma competição. Só que começando a ver atletas federados a jogar e assistindo a competições, com toda a preparação mental ou física que isso envolve, as pessoas ficam bastante curiosas e surpreendidas. 

Que diferenças há entre jogar matraquilhos num café e numa competição? 
Em competição não se brinca! Joga-se a sério, como se fosse um jogo de futebol. Não se quer perder e uma das regras é que não se pode falar. Outra é que há um timing para ter a bola, onde não se pode ultrapassar dez ou 15 segundos com a bola, e um árbitro que cronometra a posse de bola, além de fazer respeitar as outras regras. Isto é muito importante, pois assim não se pode brincar ou gozar com o adversário. É um jogo silencioso onde só se ouve a bola. No café é completamente diferente. Brincamos, convivemos, mandamos umas bocas. 

Como surgiu a Federação Portuguesa de Matraquilhos? 
A Federação existe desde 7 de fevereiro de 2007. Antes existiam várias associações ligadas a empresas de jogos. As empresas, para promoverem o seu trabalho, faziam uma concentração de atletas, formavam uma associação, embora não fosse oficial, nem sequer reconhecida pelo Estado. Mas foi assim que em 2007 surgiu a Federação, a exemplo do que aconteceu noutros países, a partir dessas pequenas associações. Em 2012 a Federação deverá ter reconhecimento público. Com o dinheiro que poderá vir, pretende promover este desporto e encontrar mais atletas. 

Como está estruturada a competição em Portugal? 
Existem campeonatos distritais e os vencedores disputam entre si o título nacional, num campeonato nacional. São os clubes dos distritos, entre eles, que organizam e realizam torneios. Este campeonato tem regras distintas, muito por causa da mesa portuguesa que é bastante diferente. Contudo, está-se desde o ano passado a adaptar as regras aos moldes internacionais. Atualmente, o campeão português é André Mendes, de Setúbal. Desde o início desta federação, ganhou todos os campeonatos. É um atleta que gosta de jogar e desde miúdo o faz. Destaca-se e joga muito bem tanto na mesa portuguesa como nas mesas internacionais. No primeiro torneio internacional em que participou ficou em nono lugar, ganhando a atletas que estavam no top 15 mundial. 

Nélson da Rocha mostra ao DEV como se joga
Como é uma competição? 
É como no Mundial de futebol. Entramos no torneio de manhã, temos uma fase de grupos com oito jogos para disputar e, no final dessa fase de grupos ficamos ou não apurados para a fase seguinte, a eliminar. Ganha o jogo quem vencer primeiro três sets, sendo que ganha um set o primeiro a chegar aos cinco golos. Num Mundial há quatro dias e quatro provas mas, num torneio básico, internacional, num Pro Tour, no sábado é o torneio dos pares e no domingo é o torneio individual. 

Em Viana, quem quiser jogar matraquilhos federado onde o pode fazer? 
O clube mais próximo está no distrito de Braga. A Federação Portuguesa de Matraquilhos está de braços abertos, à espera que alguém tenha apetite e vontade de organizar e gerir um clube na zona de Viana. Pode começar num café. Associam-se com a Federação, obtendo assim ajudas. 

Como se tem processado o crescimento da modalidade em Portugal? 
Em termos de atletas até na Federação Internacional, sediada em França, ficaram surpreendidos quando verificaram que no primeiro ano, em 2007, inscreveram-se 600 atletas. Agora, com a crise tem sido complicado e o número de praticantes baixou para cerca de 400 federados. Para se ter uma noção de como funciona no estrangeiro, na Alemanha há sete divisões de clubes. Na Alemanha têm mais de dez mil atletas federados. Os únicos países que levam esta modalidade como um desporto são os EUA e a Alemanha. Têm as melhores formações. Um dia, quando este desporto estiver nos jogos olímpicos, eles vão estar no topo certamente. Depois, há a França e a Bélgica. 

Nélson da Rocha é responsável por ligar
atletas ao selecionador
Como é feita a seleção para a equipa Nacional? 
Os jogadores de cá são selecionados através dos campeonatos distritais e respetivo campeonato nacional. No estrangeiro vejo os atletas que jogam na Alemanha, Inglaterra, analiso os rankings na internet e conheço os que jogam em França. Mediante isso vou buscar os melhores atletas portugueses emigrantes. No último mundial tivemos dois jogadores de França e cinco atletas que são dos melhores da Liga Sul da Alemanha que, estando lá, não conheciam ninguém Há um jogador, o Paulo Nunes, que é o Cristiano Ronaldo dos matraquilhos. Quando começamos fui convida-lo a jogar por Portugal. Ele durante dois anos disse que não queria, que estava a jogar pela seleção francesa, onde foi campeão do mundo e vice campeão do mundo várias vezes. Quando viu há três anos, com os poucos meios que tinha, o investimento feito por esta federação (levou mais de 30 pessoas de Portugal a um torneio mundial! Éramos a maior representação a seguir à Alemanha) decidiu jogar por nós. 

Como foi a participação de Portugal no último Mundial? 
No Mundial de multi table, denominado por World Cup, nas cinco mesas jogadas ao mesmo tempo (ou seja, a Seleção Portuguesa joga na sua mesa, se encontra a Alemanha, joga um set na mesa alemã e outro set na portuguesa. Se ficar 1-1, jogam-se duas bolas em cada mesa), ficamos na primeira divisão, o que foi importante pois no próximo ano vão criar primeira e segunda divisão de países. Estamos no top 16 mundial. Quando começamos, estávamos no nível 40, em 2007, e para o ano vamos concorrer para ficar no top 16 ou entrar, como é meu desejo, no top dez. Apesar de sermos uma federação pequena, com poucos meios, temos possibilidades, porque agora o Paulo Nunes está a jogar connosco. No último mundial conseguimos o primeiro título por Portugal. Ficamos com a medalha de bronze. Francamente era o nosso objetivo. Agora esperamos conseguir um maior número de apoios privados e públicos. 

Mesa oficial de França: Bonzini
Quantas mesas oficiais existem? 
Há cinco mesas homologadas de matraquilhos [Portugal (Scorpion), França (Bonzini), USA (Tornado), Alemanha (Leonhart), Itália (Gerlando)]. Cada país pode organizar torneios nacionais e internacionais numa mesa à sua escolha. Cada mesa tem as suas vantagens, qualidades e inconvenientes e depois cada atleta tem a sua especialidade. É como no ténis, há aqueles que preferem jogar no relvado ou na terra. Na mesa francesa os jogadores são em chumbo, mais pesados. Já nas mesas alemã e italiana os jogadores são em plástico, o toque de bola é completamente diferente. A minha preferida é a francesa, mas já começo a gostar de jogar noutras mesas, como a mesa oficial portuguesa. Não gostava nada das mesas de plástico, mas como vou a campeonatos internacionais tenho que treinar nessas mesas. Geralmente, quem tem mais experiência, mesmo não se dando bem noutro tipo de mesas que não a sua, vence. 

Como é organizado o ranking mundial se as mesas são diferentes? 
Por exemplo, fui jogar à Dinamarca na mesa francesa e lá marquei pontos não só a nível nacional (França) como internacional. Daqui a uns dias vou à Alemanha jogar o Mundial de mesa alemã, conseguindo pontos para o ranking internacional. Já em França vou fazer oito torneios, quatro dos quais internacionais. Ou seja, marco pontos para o ranking nacional e internacional. 

Quem pode jogar matraquilhos? 
Aquele que, verdadeiramente, é viciado e fanático neste jogo. 

Há uma idade mínima para entrar? 
Em competição podem entrar a partir dos 12 anos, até antes, mas há pouca gente. Têm que ir com os pais, são muitas despesas e as crianças não podem ir com qualquer pessoa. 

A entrada em competições vive essencialmente dos jogadores? 
As minhas despesas são por minha conta. Quando vou para o estrangeiro pago o bilhete de avião e o hotel. Depois, dependendo do resultado no torneio, poderei ganhar algum dinheiro. Conseguindo chegar às meias finais já deverá cobrir ou até superar as despesas. Não entrar no top dez nem as despesas cobre, foi-se lá pelo prazer. 

Pode dizer-se que é um desporto caro? 
Sim. É por isso que de há três anos a esta parte os portugueses participam pouco. Por exemplo, tive conhecimento de um rapaz que andava na escola, queria participar, mas não pôde porque não tinha meios económicos para o fazer. Em Portugal é difícil, mas até na França não vou fazer todos os torneios, porque fica muito dispendioso. Tenho que selecionar alguns torneios se quero ir mais para o estrangeiro. 

Como foi o seu percurso nos matraquilhos? 
Comecei no café, na escola e depois aos cinco anos fui fazer um torneio no café de Paris onde se encontravam atletas profissionais, com luvas, elásticos e na desportiva inscrevi-me. Não fiz grande coisa mas fiquei logo a gostar. Comecei a frequentar um café em Paris onde os grandes atletas costumam estar. Fui jogando, aprendendo, vendo como eles jogavam, conhecendo-os. Ao final de um ano disseram-me para fazer torneios. Achei melhor esperar mais um ano, porque não conhecia os truques todos, e no final desse ano inscrevi-me. Fui para o mesmo clube deles e em 5, 6 torneios fiquei logo no top 30 francês. 

Se tivesse de convencer alguém a jogar matraquilhos, como o faria? 
Nada melhor que mostrar um vídeo, para ver o que se pode fazer com a bola. Mas, muitos só de ver isso já desistem. Não têm paciência para praticar. Assistir a um torneio também pode ser muito bom porque aí sim, vê-se toda essa preparação e qualidade de que falei. O que quero é que haja um clube em Viana, no qual possa, por volta desta altura, treinar todos os anos.

Exemplo de um jogo de matraquilhos

Passa&Corta 
Nome Nélson da Rocha 
Idade 33 
Profissão Vendedor 
Posição/Cargo Duplas (defesa) e FPM (Secretário Técnico Nacional: entra em contacto com o selecionador nacional e com os jogadores) 
Clube Evry Les Coyotes (campeões nacionais França 2010 Masters) 
Ranking Nacional (França) 20.º; Internacional 80.º (Julho) 
Principais títulos Melhor Master (0 derrotas); Vice campeão Mundo Master 2008 (duplos por sorteio); melhor par Master 
Caraterística positiva Carácter lutador
Caraterística negativa Após algumas horas baixa a concentração

José Domingos Ribeiro com Pedro Borlido

2 comentários:

  1. Há algum café ou clube onde posso jogar numa mesa destas do video onde posso em Viana do Castelo?

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    1. Há em Lanheses, no salão de jogos do café Berto e em Lisboa, em são João da Talha.

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